07082007a
Loucura,
o som do vento soprando
Nas árvores o balançar de folhas e galhos
rufando alto
um enorme pulmão ofegante
respirando no escuro com dificuldade
ressonando na noite enquanto a cidade dorme
Exaurido,
não só o pulmão
resfolegando um ar frio de fim de outono
as pernas executando um balé automatizado
colocando passos sobre passos sobre passos
os pés carregando um par de sapatos cansados
um suor que escorre insensato debaixo do casaco
faltam bolsos para tantas mãos tão geladas
falta um fluído que acenda, incendeie, satisfaça
O rosto sem expressão não empresta mais nada
nem um sorriso, nem um riso, nenhuma gargalhada
a alegria dos dias de ontem foi cortada
foi-se
Os esgotos abrigam as baratas
que já não ousam colocar suas patas nas calçadas
estão todas esgotadas
Calçadas cansadas, vazias, vagas
os bancos de praça abandonados
silêncio soturno
nada nem ninguém parece estar acordado no mesmo quilômetro quadrado
Há algum tempo ainda havia os “da rua”
as vítimas das patrulhas
das operações oportunas de porra nenhuma
do pé na porta imposto, poderoso e apocalíptico
havia os que deviam a vida
os mesmos que devem ter acabado com ela
pra não pagar mais uma dívida imposta
havia essa gente
indigente
O céu está armado
não dá pra se abaixar
muito menos tentar correr
melhor apenas continuar caminhando
nada que desperte os que estão dormindo
nada que desperte a atenção
pensar no passado não leva a nada
uma garrafa de vinho apenas
levaria toda a tristeza embora
traria o passado à tona
uma garrafa de vinho sempre tornou o passado mais vivo
até mais vivo do que o desejado
mal passado
Os pássaros deveriam ir para o sul no inverno
mas estamos quase lá e os pássaros não estão chegando
o céu está armado, tudo mais ao redor está se armando
está sendo armado
talvez este ano os pássaros tenham mudado de lado
melhor esquecer e se manter caminhando
O gigante morto sopra mais uma vez sua brisa gelada
pulmão tuberculoso da noite
tosse duas ou três vezes, prenunciando
o bufar de uma brisa que seria a última antes da chuva
e então um sopro molhado assalta o rosto
Frio
é a garoa que dança no ritmo do vento
e é impossível prever seus passos
imprecisos, embriagados
Inveja da chuva
Pra qualquer lado que olhe a visão não encontra ninguém
sente apenas os olhos pesados de uma vigilância injustificável
nada de vistas-grossas
qualquer sentimento é motivo para uma chuva de perguntas e violência
no entanto, sente apenas a oportunidade de chorar
mas não é o momento
tudo ao seu tempo
Respira fundo como se o mundo fosse puro
como se o ar não fosse imundo
olha mais uma vez para cada lado
sente agora o alívio de ter dobrado uma dúzia de esquinas erradas
adentrar o nada que enegrece cada centímetro do terreno insone
uma garganta calada à prova de olhos grandes
sedenta, guardando uma porta de volta para a terra do nunca
do que nunca deveria ter mudado
tateia na escuridão suja das paredes e então desaba
uma chuva que o chão há horas aguardava
o chumbo grosso disparado de grossas nuvens cinza chumbo
carregadas
o céu está armado
Olha bem ao redor
do seu lado só palavras
os ombros carregam sem desconto o casaco ensopado
cada vez mais pesado
um estorvo não fosse o frio intenso
a violência da chuva incessante lava a alma
traz à tona memórias desagradáveis e desesperadoras
o momento de chorar e não sentir mais nada
esquecer o som das meias molhadas
das centenas de problemas
das palavras mal faladas
houve um tempo em que a chuva e as lágrimas mandavam tudo isso embora
uma dose bem servida, bem chorada
o momento passou, agora é hora de abrir a porta de volta
O som se propaga
o cheiro da cera derretendo sob a luz das velas
e suas chamas que combatem a escuridão de uma energia que foi cortada
foi-se
é inútil secar o rosto
é desnecessário
enquanto ainda pode sentir o gosto salgado do suor nas mangas encharcadas
inútil pensar no passado
nas palavras mal faladas
na sede que nunca cede
o céu está carregado e está disparando
sem poupar ninguém nem mais nada
o que resta é esquecer por um instante tudo que antes abominava
antes que os gigantes venham fazer sua jogada
seu circo cínico
Passando da meia noite
pensar demais é perseguir pesadelos
última chance de pedir mais uma dose
uma droga
uma música ao piano
ou apenas uma companhia para esquecer dos anos que passaram
esquentar os dedos, aquecer a garganta com uma conversa
última chance de pedir um tempo
mas não qualquer tempo
aquele tempo em que era preciso pedir passagem
entre as mesas estacionadas nas calçadas sujas da cidade baixa
pedi-lo de volta
será que é pedir demais?
Fumaça de cigarros compartilhada
misturando-se com o vocabulário escasso dos operários
oportunidades perdidas e o pior de tudo
pilhas de pecados imperdoáveis
Nada que os ouvidos não possam ignorar, que a mente não possa esquecer
entre um trago e outro
é direito culpar alguém aqui?
não, é cada vez mais difícil encontrar alguém direito
Olhar ao redor e reconhecer velhos amigos quase irreconhecíveis
conhecidos da noite e nada mais
operando no submundo confuso entre posses e policiais
a corrupção construída para destruir ideais
nunca uma bebida custou tão caro
e, é claro, que alguns de nós vão pagar
a alegria do lugar tenta abafar as conversas confusas em código
o inimigo está aqui dentro
dentro de nós
resta saber quem vai deixá-lo sair
resta saber quanto tempo ainda tenho pra sair daqui
tomar a rua novamente
sentir-se seguro sem nenhum muro para me proteger
caminhar pelas ruas escuras sob a chuva e olhares pesados
esquecendo de evitar as poças
colocando passos sobre passos sobre passos
até a tempestade passar
parece impossível pensar em outra coisa
Respirar fundo, trocar um olhar e pedir a dose de misericórdia
a passagem de volta para a realidade
a injetada glicose indesejada da madrugada
antes que a noite termine com as velas
com um pranto impraticável e perverso
um pé na porta imposto, poderoso e apocalíptico
tarde demais...
Loucura,
o som do vento soprando
Nas árvores o balançar de folhas e galhos
rufando alto
um enorme pulmão ofegante
respirando no escuro com dificuldade
ressonando na noite enquanto a cidade dorme
Exaurido,
não só o pulmão
resfolegando um ar frio de fim de outono
as pernas executando um balé automatizado
colocando passos sobre passos sobre passos
os pés carregando um par de sapatos cansados
um suor que escorre insensato debaixo do casaco
faltam bolsos para tantas mãos tão geladas
falta um fluído que acenda, incendeie, satisfaça
O rosto sem expressão não empresta mais nada
nem um sorriso, nem um riso, nenhuma gargalhada
a alegria dos dias de ontem foi cortada
foi-se
Os esgotos abrigam as baratas
que já não ousam colocar suas patas nas calçadas
estão todas esgotadas
Calçadas cansadas, vazias, vagas
os bancos de praça abandonados
silêncio soturno
nada nem ninguém parece estar acordado no mesmo quilômetro quadrado
Há algum tempo ainda havia os “da rua”
as vítimas das patrulhas
das operações oportunas de porra nenhuma
do pé na porta imposto, poderoso e apocalíptico
havia os que deviam a vida
os mesmos que devem ter acabado com ela
pra não pagar mais uma dívida imposta
havia essa gente
indigente
O céu está armado
não dá pra se abaixar
muito menos tentar correr
melhor apenas continuar caminhando
nada que desperte os que estão dormindo
nada que desperte a atenção
pensar no passado não leva a nada
uma garrafa de vinho apenas
levaria toda a tristeza embora
traria o passado à tona
uma garrafa de vinho sempre tornou o passado mais vivo
até mais vivo do que o desejado
mal passado
Os pássaros deveriam ir para o sul no inverno
mas estamos quase lá e os pássaros não estão chegando
o céu está armado, tudo mais ao redor está se armando
está sendo armado
talvez este ano os pássaros tenham mudado de lado
melhor esquecer e se manter caminhando
O gigante morto sopra mais uma vez sua brisa gelada
pulmão tuberculoso da noite
tosse duas ou três vezes, prenunciando
o bufar de uma brisa que seria a última antes da chuva
e então um sopro molhado assalta o rosto
Frio
é a garoa que dança no ritmo do vento
e é impossível prever seus passos
imprecisos, embriagados
Inveja da chuva
Pra qualquer lado que olhe a visão não encontra ninguém
sente apenas os olhos pesados de uma vigilância injustificável
nada de vistas-grossas
qualquer sentimento é motivo para uma chuva de perguntas e violência
no entanto, sente apenas a oportunidade de chorar
mas não é o momento
tudo ao seu tempo
Respira fundo como se o mundo fosse puro
como se o ar não fosse imundo
olha mais uma vez para cada lado
sente agora o alívio de ter dobrado uma dúzia de esquinas erradas
adentrar o nada que enegrece cada centímetro do terreno insone
uma garganta calada à prova de olhos grandes
sedenta, guardando uma porta de volta para a terra do nunca
do que nunca deveria ter mudado
tateia na escuridão suja das paredes e então desaba
uma chuva que o chão há horas aguardava
o chumbo grosso disparado de grossas nuvens cinza chumbo
carregadas
o céu está armado
Olha bem ao redor
do seu lado só palavras
os ombros carregam sem desconto o casaco ensopado
cada vez mais pesado
um estorvo não fosse o frio intenso
a violência da chuva incessante lava a alma
traz à tona memórias desagradáveis e desesperadoras
o momento de chorar e não sentir mais nada
esquecer o som das meias molhadas
das centenas de problemas
das palavras mal faladas
houve um tempo em que a chuva e as lágrimas mandavam tudo isso embora
uma dose bem servida, bem chorada
o momento passou, agora é hora de abrir a porta de volta
O som se propaga
o cheiro da cera derretendo sob a luz das velas
e suas chamas que combatem a escuridão de uma energia que foi cortada
foi-se
é inútil secar o rosto
é desnecessário
enquanto ainda pode sentir o gosto salgado do suor nas mangas encharcadas
inútil pensar no passado
nas palavras mal faladas
na sede que nunca cede
o céu está carregado e está disparando
sem poupar ninguém nem mais nada
o que resta é esquecer por um instante tudo que antes abominava
antes que os gigantes venham fazer sua jogada
seu circo cínico
Passando da meia noite
pensar demais é perseguir pesadelos
última chance de pedir mais uma dose
uma droga
uma música ao piano
ou apenas uma companhia para esquecer dos anos que passaram
esquentar os dedos, aquecer a garganta com uma conversa
última chance de pedir um tempo
mas não qualquer tempo
aquele tempo em que era preciso pedir passagem
entre as mesas estacionadas nas calçadas sujas da cidade baixa
pedi-lo de volta
será que é pedir demais?
Fumaça de cigarros compartilhada
misturando-se com o vocabulário escasso dos operários
oportunidades perdidas e o pior de tudo
pilhas de pecados imperdoáveis
Nada que os ouvidos não possam ignorar, que a mente não possa esquecer
entre um trago e outro
é direito culpar alguém aqui?
não, é cada vez mais difícil encontrar alguém direito
Olhar ao redor e reconhecer velhos amigos quase irreconhecíveis
conhecidos da noite e nada mais
operando no submundo confuso entre posses e policiais
a corrupção construída para destruir ideais
nunca uma bebida custou tão caro
e, é claro, que alguns de nós vão pagar
a alegria do lugar tenta abafar as conversas confusas em código
o inimigo está aqui dentro
dentro de nós
resta saber quem vai deixá-lo sair
resta saber quanto tempo ainda tenho pra sair daqui
tomar a rua novamente
sentir-se seguro sem nenhum muro para me proteger
caminhar pelas ruas escuras sob a chuva e olhares pesados
esquecendo de evitar as poças
colocando passos sobre passos sobre passos
até a tempestade passar
parece impossível pensar em outra coisa
Respirar fundo, trocar um olhar e pedir a dose de misericórdia
a passagem de volta para a realidade
a injetada glicose indesejada da madrugada
antes que a noite termine com as velas
com um pranto impraticável e perverso
um pé na porta imposto, poderoso e apocalíptico
tarde demais...
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