20041118

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..nem tão breve histórico da insegurança

A insegurança alimenta a mente doente que covardemente explora o medo. Faz com que elejamos não democratas, nem delirantes sonhadores de uma desconhecida paz, mas sim réplicas modernizadas – e porque não dizer customizadas – dos medievais queimadores de bruxas. Replicantes sem discernimento, só diretrizes. Assessorados por gênios genocidas, Merlins modernos, com todo o estudo e conhecimento das magias negras. O apartheid e a escuridão da ganância. Exterminadores do futuro. A insegurança nos põe às lágrimas, as tantas que lubrificam as engrenagens da máquina. Mas o sangue precisa ser constantemente derramado para saciar a sede do tanque. De combustível ou de guerra? Projetor de filmes de horror tipo B. O ketchup cai em desuso, é a reciclagem do material, dos costumes, das pessoas. Nunca abalando o culto à ignorância.
Seguramente rentável, o medo movimenta o comércio. As grades, as armas, alarmes. O custo da onírica tranqüilidade é às vezes muito maior do que o soldo daquele que está na linha de fogo. A linha da corda bamba que impõe o equilíbrio eternamente injustificado ou a queda dos valores, dos impérios e das cabeças. Quantos cansados de esconderem-se sob as cobertas são agora os monstros em nossos armários? Quantos cães precisam ser envenenados protegendo teatros caseiros, com 29 polegadas de status hipnótico via satélite e surround sound? E quantas crianças serão eletrocutadas buscando uma bola de plástico? Porque ao invés de prometer hospitais não educamos nossa população para que não sejam envenenados pelo alimento pré-putrefado que exporta nosso dinheiro? Porquê? Porque podemos vender vacinas que causem dependência! E a quem queremos culpar? Os que nunca sentiram a carne entre os dentes? Serão estes os delinqüentes? O que esmola na esquina pela própria segurança? Que quase nunca mata a fome, mas é obrigado a manter o pai bêbado para não ser carneado. O contraventor, o contrabandista, o contratante de mão-de-obra infantil pré-escravista. O passado não viu a paz e pasmem... o futuro é ainda pior.
Sacrilégio alimentar o perdão com o dízimo. A segurança divina não se faz presente na realidade diária. “Se deus vier, que venha armado”. Tenho muito mais medo da lobotomização que acerca os fiéis do que dos lobos que cercavam Maria e em cordeiros transformados foram. O cordeiro de deus, o devorador de pecados. É o justiceiro em cada um de nós, o executivo munido de um rifle que sobre um arranha céu – torre de Babel moderna – descarrega o peso de toda uma vida vazia e sob pressão. A toda criança parida, fruto de pecado, é implicado um alvo cefálico. E nós passamos a vida disfarçando com cortes de cabelos, que distinguem tribos as quais não oferecem nada mais do que o culto à futilidade. E onde estão os cinemas de bairro? A insegurança é a mãe da geração shopping center, por isso dispendemos fortunas em um lazer que até ontem era algo tão social. Hoje elitista. O trânsito em um transe caótico é um afronte à minha inteligência. Estamos sepultando o transporte público e em breve sepultaremos os descendentes que estão por vir, pois não agüentarão os níveis de monóxido de carbono destilados diariamente nos céus das grandes cidades. Ou pior, viveremos entre mutantes supertolerantes, que saciarão suas vontades sabe-se lá com quê.
Nas vilas a vil realidade retrógrada. A lei do olho por olho, dente por dente determina o perfil patético das sociedades secretas que estão emergindo por dentre os emergentes; que até então se mostravam tão seguros em suas fortalezas de pedra, aço e espinhos. Agora pagam impostos aos subcomandos que pela porta da frente entraram com os avanços da química moderna. As drogas que embalam as festas e embalsamam os corpos são as que pagam a tranqüilidade de contos de fada, com as ameaçadoras mensagens subliminares que só tolos ultra-intelectualizados não entendem, na ânsia de encontrar significados inóspitos, mas nem tão geniais quanto imaginam suas cabecinhas ‘nazidisciplinadas’. O medo fabrica heróis virtuais que diariamente mentem nos jornais. Vamos desfigurar os bandidos pra que não tenham que esconder o rosto ante as câmeras renegando os seus quinze minutos de fama. Seja marginal, seja herói? O coelho playboy de capa de revista que visita o submundo de orelhas em pé e nariz vermelho, atrás da diversão drugo-pornográfica que antes só acontecia em portas fechadas e para uma elite dominadora. Mas, hey baby, let’s take a walk on the wild side. Após a meia noite, automóveis se tornam tão letais quanto armas espaciais, desintegram famílias e desaparecem no vácuo como se ocultados por um buraco negro. Tele-transportados para o calor de seus edredons, tendo como única ameaça uma vaga possibilidade de vômito, enquanto sarjetas se alimentam de sangue inocente nas grandes avenidas. E quem de nós era inocente?
O futuro não tem seguro de vida. O plano de saúde será um cordão umbilical? Será que não vamos derrubar as células-tronco antes que tenham fixado raízes fortes o bastante para agüentar nossos gênios tempestuosos? O presente da ciência será um presente para o homem? Ou buscaremos no passado o antídoto para nossos venenos? Vamos exumar e exaltar todos os caciques que o capitalismo selvagem mandou para o underground, talvez eles aceitem nos dar as respostas em troca de mais quinhentos anos de escravidão ou exílio. Um mundo tão pequeno e pessoas menores ainda. Então porque não há espaço suficiente e nos obrigamos a excluir tantos de nós? Será que os Super-Homens que deveriam nos dar proteção não estão ocupando este espaço com seus alter-egos de aço. Meus olhos ficam vermelhos quando penso no que posso, mas não faço. E logo me despeço do que peço, e acho, nunca vou encontrar. A maldita paz.