20041004

04102004b

... em meio a bagunça lá de casa, encontrei nas coisas antigas do meu pai,
uma folha de ofício três vezes dobrada e bem amarelada, contendo o texto a seguir:


Será que valeu a pena?

Um dia você vai ver que não compensou toda a correria para ganhar dinheiro e destaque profissional e no fim não usufruir os bens que eles poderiam lhe conceder. Vai ver que o tempo passou e o cansaço tomou conta do seu corpo. Vai ver que, mesmo rodeado de muita gente, você se sente só. Um dia você vai recolher-se no quarto e vai ter vontade de abraçar o travesseiro porque não sobrou mais ninguém para abraçar. Vai ver que foi entrando numa roda-viva e agora não é mais dono do tempo que dizem que é seu. Vai ver que o carro é problema e não conforto; que o telefone é chato; que a gravata aperta e incomoda; e, por mais que tente livrar-se de tudo, você é um escravo invejado por muitos. Vai ver que não valeu a pena os anos sem férias, sem descanso. Vai ver que não tem mais ilusões e que a esperança anda com vontade de dormir. Um dia você vai ver que passou pela vida sem viver, freqüentou o mundo sem saber pra que, rodou, rodou e não saiu do lugar. Pensou que foi e ficou, teve tudo e não sentiu nada. um dia você vai ver que o tempo se escoou pelos seus dedos como areia fina. Vai ver que o que resta ainda é parar e gritar para si: “chega!”. Vai ver que é hora de rir, de amar, de ser família, de misturar-se com as crianças e “começar” a aprender com elas a viver.

... isso deve ter uns quinze a vinte anos no mínimo, pela cor do papel e por ser datilografado, mas..


pai, será que algum dia o senhor leu isso?
.. espero que não, fica mais fácil de aceitar . ..
eu não entenderia o significado desse texto se tivesse sido diferente
e talvez eu não soubesse o que fazer hoje
quando você me diz que não sou um exemplo de filho
04102004a

Deprimido...
abrindo presentes
precedentes
debaixo da árvore de natal
e tudo parece ser tão real
que me faz a cabeça?
uma ilusão de ótica
ou outra garrafa de vodka
que faça com que ela
me esqueça
me peça
tudo o que resta
uma resga de minha sobriedade
uma dose? quem sabe...
e quem pode . . . saber
e quem quer?
outra dose? você pode
outra garrafa . . . me afogue
me passa
me faça
esquecer que abri
precedentes pra ti
pra você, pra te perder
nem sei porque?
por quem sabe cansei